Ao abrir cada volume dos diários de Miguel Torga, das edições "Coimbra", tenho de rasgar folha a folha os limites superiores e ou laterais dessas páginas.
E lá vou rasgando!.... Lentamente, como se de uma álbum de recordações se tratasse.
As primeiras páginas estão impecavelmente separadas umas das outras. A cautela! Como se de uma preciosidade se tratasse! Não queria ferir Torga no que mais de precioso ele teria, afinal sempre o amei pela sua profissão... a de escritor! (Diário IV)
O cuidado!... Porque afinal eram as últimas edições da editora. E li cada palavra como se fossem as últimas da vida de Torga.
Optei por ir rasgando-as momento a momento. Como se ao rasgar fosse escrevendo o meu diário privado sobre o diário de Torga.
Há depois aquelas páginas que estão descuidas, imperfeitas... porque eu queria mais e mais, e a frustração tolda-me o pensamento!
Outras cortei-as no avião para Estocolmo, e com elas vinha o inverno de alguns tormentos na vida de Torga... foi quando mais quis escrever aqui... O cuidado voltou!
Mas o verão seguinte aproximava-se e com ele Torga volta a apaixonar-se pela natureza e por todos os lugares por onde passava.
Voltei a rasgar violentamente! Como este homem teria tempo para num dia estar no Porto e no dia seguinte escrever de Bragança?
No final, no avião que me traria de regresso a Lisboa após uma semana de trabalho e de férias, voltei a submeter o livro à minha dissecação mais suave... aproximava-se o Outono e o Inverno!
Um dia vou reler estes volumes e ir-me -ei lembrar que cada dissecação representava um momento carregado de emoção... porque é este o cunho pessoal que gosto de dar!